Bebê baiano com zika tinha líquidos no cérebro; caso raro alarma pesquisadores americanos
A gravidez de uma jovem do interior da Bahia, interrompida de forma trágica, mudou o entendimento dos médicos e cientistas sobre o vírus da zika. Seu bebê, abortado de forma induzida no oitavo mês de gestação, nasceu morto, com anomalias congênitas à infecção pelo vírus nunca antes relatadas.
O caso da mulher de 20 anos, moradora de uma cidade pequena (são as únicas informações que os envolvidos nos estudos revelam), foi relatado ontem na revista científica Plos Neglected Tropical Diseases, uma das mais importantes do mundo. O trabalho relata o primeiro caso no mundo com uma condição conhecida como hidranencefalia, no qual a massa cerebral desaparece e a cavidade é tomada por um líquido, calcificações intracranianas e diversas outras lesões.
“O cérebro fica destruído”, diz o professor de clínica médica da Universidade Federal da Bahia (Ufba), Antonio Raimundo de Almeida, que também é diretor-geral do Hospital Roberto Santos (HGRS). Ele assina o artigo junto com o médico fetal Manoel Sarno e pesquisadores americanos das Universidade Yale e do Texas. Todos eles observam que o bebê apresentou ainda uma outra característica que até então não tinha sido relacionada ao zika: a hidropsia, ou seja, o acúmulo de líquido em diversas partes do corpo.
Dois pontos chamaram a atenção nesse caso. Primeiro, as alterações em outros órgãos que não são do sistema nervoso central. “Constatamos a presença de líquido em diversos compartimentos fetais. É a chamada hidropsia”, explica Almeida. Segundo, o fato de a paciente ter sido assintomática, ou seja, não ter sofrido com qualquer tipo de sintoma relacionado à doença. Até a 14ª semana, a própria gestação seguia normal, quando foram identificadas as primeiras alterações.
A partir da 18ª semana, exames de ultrassom chamaram a atenção pelo fato de o bebê ter alterações cerebrais graves. No final da gestação, começou a ser notada hidropsia fetal. Para realizar os exames, os médicos retiraram partes do tecido cerebral, da medula espinhal e o líquor (fluido corporal). O vírus foi achado em todos os locais.
“Fizemos exames para afastar as outras doenças que provocam hidranensefalia, como toxoplasmose, megalovírus, rubéola e sífilis. Nada disso foi detectado. Só o zika”. A partir daí, eles sequenciaram o genoma do vírus, ou seja, identificaram seu DNA. “A variante é asiática. É do mesmo tipo que circula pelo Nordeste e inicialmente foi encontrado em Natal e na Paraíba”, diz.